Criança não tem botão de pausa. Não espera até que haja consenso entre políticas ou políticos para continuar a crescer.
No mês em que saíram os resultados dos Indicadores Federais que podemos usar para medir os impactos da pandemia na Educação brasileira, separamos 3 perguntas e respostas referentes aos resultados nada positivos e tampouco surpreendentes do Ideb e Saab deste ano.
O Ideb funciona como um indicador nacional que possibilita o monitoramento da qualidade da educação pela população por meio de dados concretos, calculados a partir de dois componentes: a taxa de rendimento escolar (aprovação) e as médias de desempenho nos exames aplicados pelo Inep. Os índices de aprovação são obtidos a partir do Censo Escolar, que é realizado anualmente. Já o Saeb é uma avaliação para diagnóstico em larga escala com o objetivo de avaliar a qualidade do ensino oferecido pelo sistema educacional brasileiro, a partir de testes de português e matemática e questionários socioeconômicos. Fonte: Ministério da Educação
Que tipo de déficit / consequência já podemos apontar a partir de resultados do tipo? Na 2ª serie crianças não serem capazes de ler palavras isoladas, e na 5ª série não conseguirem identificar uma figura geométrica? Dá pra recuperar isso?
Precisamos olhar para esses resultados como parte de um longo período de descaso com a educação do nosso país. E lembrar que só vamos encontrar um caminho para dar a educação de qualidade a que nossas crianças têm direito quando, além de políticas educacionais sérias, família e escola caminharem juntas! Uma criança de 5a série que não sabe identificar um círculo ou um triângulo entraram para as aulas remotas já com um enorme déficit de aprendizagem. Elas foram crianças de 2o ou 3o ano que ainda não tinham aprendido formas geométricas. Infelizmente, a pandemia só veio trazer um holofote a um enorme problema que estava sendo deixado para depois, e que muitos preferiam não discutir.
Criança não tem botão de pausa. Não espera até que haja consenso entre políticas ou políticos para continuar a crescer. As consequências dessa enorme lacuna de aprendizagem vêm no curto prazo em forma de abandono escolar e crianças que vão crescer acreditando que são menos capazes, que não nasceram para “isso”. As alternativas que restam quando falta educação são as mais tristes e negativas possíveis para as famílias e deságuam em seríssimas questões sociais que se tornam âncora para o crescimento do país. Ou seja, no médio e longo prazo, perdemos todos: escola, que fica com um profundo sentimento de frustração; família, que não encontra caminhos para um presente, e quem dirá futuro, melhor para os filhos e sociedade, que acaba por perpetuar um sistema que favorece e privilegia aqueles que podem pagar por educação de qualidade para poucos.
Uma aposta foi o ensino remoto, mas a "implementação" por aqui não parece ter contado a favor. Por quê?
As aulas remotas implementadas durante o período de fechamento das escolas foram o caminho possível para que uma parte das crianças em idade escolar não perdesse o contato com a escola. Uma pequena parte, que já tinha acesso à educação e recursos educacionais de qualidade que nosso país há tempos já deve a todas as crianças, conseguiu manter o aprendizado. Ainda assim, com prejuízos no potencial como aluno, prejudicado pelas angústias impostas pelo momento que a própria família enfrentava dentro de casa e também pela falta do convívio no ambiente escolar.
Os professores e profissionais da educação já vêm, desde o retorno às aulas presenciais, sinalizando que as perdas foram gigantescas. Implorando por formação, estratégias, políticas e recursos pensados para os próximos anos, com foco na lacunas que ficaram para todos os alunos.
As famílias, por outro lado, também carecem de suporte, apoio e educação para que saibam como ajudar para que os filhos consigam, ao longo dos próximos anos, recuperar tanto o potencial de aprendizagem quanto voltar à adequação idade-série que se perderam ao longo do meses de aulas remotas.
Precisamos ainda lembrar que a grande maioria dos alunos, em especial de escolas públicas, passou os dois anos de escolas fechadas sem contato algum com a escola. O resultado do Saeb e Ideb escancaram o que já estava ali, dentro da escola ou nos lares de muitos brasileiros, gritando por socorro.
A aprovação automática foi uma medida para "diminuir o atraso", e agora distorce o Ideb, que é baseado no índice de aprovação. Quais as piores consequências que a aprovação automática pode trazer para aos alunos?
A aprovação automática foi, antes de tudo, uma medida para manter a roda da educação girando. Caso os alunos se mantivessem na série em que estavam quanto as escolas fecharam, o que aconteceria com as crianças em idade para começar a vida escolar? Não haveria escola para elas!
O grande problema foi a falta de uma política educacional focada em identificar e estruturar um plano de longo prazo para lidar com as lacunas de aprendizagem que ficaram.
Os prejuízos dessa falta de planejamento é enorme, tanto no aspecto cognitivo, quanto emocional para os alunos.
Não podemos culpar a “aprovação automática” e deixar escapar o verdadeiro vilão dessa história: a falta de valorização e respeito à educação comprometimento de nossos governantes com educação de qualidade para todos.
Basta pensar que, se decidirmos agora que este ano todos os alunos serão reprovados, como tentativa de contornar todos as perdas confirmadas pelo Saeb e Ideb, vamos levar mais um susto no final de 2023. Isso porque todos os alunos teriam as mesmas aulas deste ano. E os prejuízos que vieram se acumulando há anos, ainda ficarão ali, sem qualquer atendimento.
Assim como tantas outras questões da educação, a complexidade do que vivemos agora não nos permite afirmar que há um culpado ou uma única solução para o caos que temos a resolver.
Formação de professores, olhar sistêmico, acesso à tecnologia, envolvimento da família, estrutura física das escolas, comprometimento de lideranças políticas, proposta de recuperação do aprendizado a partir de diagnósticos confiáveis são apenas alguns dos fatores que precisam ser imediatamente prioridade total das lideranças educacionais do nosso país!
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